Finalmente seu pai havia acabado mais
um quadro. Estava ansioso para ver o que ele pintara. Era sempre assim,
gostava de ficar no atelier vendo aqueles quadros, imaginando a história
de cada um e quando o pai deixava, lambuzava alguma tela com tinta
também, mas somente enquanto esperava-o terminar suas obras de arte.
Gostava de quase todos. Algumas
pinturas ele não entendia, outros eram muitíssimo lindos, e sempre que o
pai entrava ali, corria para ver como seria a mais nova preciosidade
que nasceria daquelas mãos que com tanto carinho, muitas vezes lhe
abraçava e que com o mesmo sentimento acariciava aquelas telas.
Mas naquele momento, lá estava
ele, pendurado na parede, o mais novo quadro, recém saído da
sensibilidade de seu jovem pai, perto da janela. A tinta ainda fresca,
não impedia que a beleza contida na tela fosse admirada. Seu pai com um
olhar sereno caminhou em sua direção, como que perguntando: “Gostou?”, e
em silêncio deu-lhe um beijo nas bochechas saindo em seguida,
deixando-o sozinho no atelier.
Como em estado de hipnose, Ele
ficou, ali, parado, quieto, em silêncio, apenas contemplando a bela rosa
branca, delicadamente pintada naquele quadro. Era uma rosa feita de
papel de cartas. Cada pétala era uma carta e muito provavelmente, cartas
de amor de algum romântico apaixonado. O que estaria escrito naquelas
pétalas? Poemas, declarações de amor, carta de despedida, não sabia.
Sabia apenas que era uma singela flor e que estava sozinha naquele
quadro, solitária em seus segredos, silenciosa em suas pétalas, a espera
somente de um lugar ideal para desabrochar na imaginação daqueles que a
contemplariam.
De repente o vento de final de
tarde soprou suave invadindo o ambiente pela janela, balançando a
cortina, trazendo em sua companhia uma pequena borboleta, que com toda a
beleza de seu vôo, vasculhou cada canto daquele pequeno cômodo, como
que escolhendo um lugar para sossegar as suas asas.
Ele, o menino, apenas
acompanhava com os olhos o belo voo da borboleta, tentando adivinhar
onde ela iria pousar, e num estalo, imaginou como aquela rosa solitária
ficaria feliz com a companhia de uma borboleta pintada ao seu lado no
quadro, com quem, assim, poderia compartilhar os seus segredos de amor.
Correu então para falar com seu pai e pedir-lhe que fizesse conforme
imaginara.
Porém quando voltou ao atelier,
quão grande surpresa ambos tiveram, pois com uma nova lufada, o vento
suavemente empurrou a borboleta que, com sua fragilidade, se deixou
vencer pela força do vento e pelas artimanhas do destino, acabando
assim, presa na tinta fresca, ao lado da rosa e livre na ingênua
imaginação do menino.
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