Slideshow

quinta-feira, 24 de maio de 2012

terça-feira, 22 de maio de 2012

ELEITORES CONSCIENTES

Estamos em ano eleitoral, e percebe-se no ar um clima tenso entre os partidos, candidatos e eleitores. As instituições políticas estão em um completo alvoroço. Todos em busca de apoios e acordos que possam favorecer seus candidatos. Especulações correm à solta, e de ouvido em ouvido, dão vida a esquemas políticos e planos elaborados para tentar ludibriar não somente a população, mas também os adversários. Nesse jogo de blefe, ambos com os mesmos interesses trabalham em prol de seus candidatos. Mas aproveitando-se do desgosto do povo com o atual governo de nossa cidade, a oposição se coloca em posição de luta e trabalha unindo-se em coligações e traçando estratégias que possam lhes garantir a vitória, sempre em conspiração contra aqueles que estão no poder.


Observando todo essa movimentação das organizações políticas, de uma forma mais analítica, percebo que por trás de todas essas especulações que circundam os candidatos políticos que já conhecemos, e embora o povo reclame, murmure, esperneie, digo com toda certeza que repetiremos o mesmo erro das eleições anteriores e votaremos nesses mesmos candidatos.

Porém, se prestarmos mais atenção, veremos que no meio desse “disse-me-disse” há sempre alguém em quem se possa depositar confiança. São aqueles homens e mulheres que encaram o desafio de se expor, em uma luta que é de todos, em busca da igualdade social, de melhores condições de vida para a população, e muitos de nós não nos damos conta, nem se quer prestamos atenção nessas vozes que querem gritar por nós, mas são abafadas pelo nosso descrédito. O povo quer mudança, mas não muda! O povo reclama, mas não protesta! O povo fala mal de seus governantes, mas é tão corrupto quanto eles, ao vender seu voto ao preço de favores medíocres e egoístas. Desconfiamos de todos porque não confiamos nem em nós mesmos. Escolhemos sempre os mesmos calhordas corruptos por preferir acreditar em suas mentiras, e ter motivo para reclamar e fazer dessas mentiras verdades que só denigrem a imagem de nossa cidade, estado e país.

Paremos para observar aqueles que se propõem a lutar por nós e ouvir o que eles têm para oferecer não a mim, nem a você individualmente, mas a sociedade que clama por um governo mais justo, por uma política mais honesta, por homens íntegros e retos, cujos ideais não se sobrepõem aos interessem do povo.

Sejamos eleitores conscientes! Viva a democracia que ainda sim permite que pessoas desconhecidas assumam papéis importantes não só na história dessa cidade, mas na história de cada um de nós, cidadãos itaperunenses.

terça-feira, 1 de maio de 2012

O "Evangelho" segundo Herbert Vianna


Herbert Vianna


Pelo amor de Deus, eu não quero usar nada nem ninguém, nem falar do que não sei, nem procurar culpados, nem acusar ou apontar pessoas, mas ninguém está percebendo que toda essa busca insana pela estética ideal é muito menos "lipo-as e muito mais piração?"

Uma coisa é saúde outra é obsessão. O mundo pirou, enlouqueceu. Hoje, Deus é a auto imagem. Religião é dieta. Fé, só na estética. Ritual é malhação.

Amor é cafona, sinceridade é careta, pudor é ridículo, sentimento é bobagem.

Gordura é pecado mortal. Ruga é contravenção. Roubar pode, envelhecer, não. Estria é caso de polícia. Celulite é falta de educação. Filho da puta bem sucedido é exemplo de sucesso.

A máxima moderna é uma só: pagando bem, que mal tem?

A sociedade consumidora, a que tem dinheiro, a que produz, não pensa em mais nada além da imagem, imagem, imagem. Imagem, estética, medidas, beleza. Nada mais importa. Não importam os sentimentos, não importa a cultura, a sabedoria, o relacionamento, a amizade, a ajuda, nada mais importa.

Não importa o outro, o coletivo. Jovens não tem mais fé, nem idealismo, nem posição política. Adultos perdem o senso em busca da juventude fabricada.

Ok, eu tambem quero me sentir bem, quero caber nas roupas, quero ficar legal, quero caminhar, correr, viver muito, ter uma aparência legal mas...

Uma sociedade de adolescentes anoréxicas e bilímicas, de jovens lipoaspirados, turbinados, aos vinte anos não é natural. Não é, e não pode ser. Que as pessoas discutam o assunto. Que alguém acorde. Que o mundo mude.

Que eu me acalme. Que o amor sobreviva.

"Cuide bem do seu amor, seja ele quem for."

Herbert Vianna - Cantor e compositor (Via Veshame Gospel)
Título Original: Cirurgia de Lipoaspiração
 
 

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Moleskine, o cativeiro de palavras

em Horizontes e esquinas por em 19 de abr de 2012

Sobre quando um Moleskine provoca os instintos mais perversos naqueles que cultivam uma obsessão pela palavra.

Costumo sequestrar palavras que não consigo conquistar em prosa. Sim, sou réu confesso. Com receio de deixá-las no vácuo entre o escrito e o cogitado, faço de meu Moleskine o cativeiro do meu não-verso, do meu não-texto. E as escrevo.



Insinuação. Guilhotina. Longevo. Instigante. Gozo.


Olho, leio, saboreio cada sílaba com tara perversa e creio que, por vezes, as palavras tremem no papel. Desfilam nas linhas dos livros, revistas e jornais em posições provocativas que me forçam a repeti-las bem baixinho. Sussurro na nuca de seu ditongo. Reproduzo um som no espaço de um hiato na esperança de que a palavra me responda do alto de sua apatia, mas nada ouço. Pronuncio não apenas a palavra, mas seu nome, nua de qualquer contexto, desamparada de sentido. E as guardo.

Cintilar. Indolência. Murmúrio. Empáfia. Lassidão.

Não há preferência, classificação de significados ou reputação etimológica. Sinto apenas atração genuína pela reação provocada na pronúncia. A língua que bate no céu da boca, uma palavra que sibila de maneira envolvente, a proparoxítona que exige um esforço sensual. E as escondo.

E assim mantenho as palavras resguardadas em meu Moleskine, forçosamente recatadas pelo meu egoísmo, sufocadas em folhas brancas, ignoradas por olhos que não sejam os meus. Vez que outra, ouço-as murmurarem. E volto para meu harém manuscrito.

Leia mais:

terça-feira, 10 de abril de 2012

Não sei ser poeta


Os três poemas à seguir fazem parte do meu primeiro livro. Espero que gostem ou não. Não esqueçam de deixar seus comentários.


NÃO SEI SER POETA

Tudo o que eu queria era simplesmente um lugar tranquilo
onde eu pudesse repousar a cabeça e descansar minha mente das preocupações da vida,
e, quem sabe assim, adormecer e sonhar com um céu mais azul,
com uma aventura entre heróis desconhecidos,
ou melhor ainda, sonhar com meu grande amor.

Porém descobri que não existe nada melhor do que a vida que se sabe viver,
que se pode viver, que se quer viver.

A vida é apenas um meio de existir,
e o sonho, uma forma de refúgio,
onde o subconsciente é tão verdadeiro quanto o mundo que vemos e em que vivemos.

Será que sei viver? Será que não sei sonhar?

Não sei as respostas para minhas indagações,
muito menos sei quais são as minhas dúvidas.
Sei apenas que meu refúgio é secreto enquanto for apenas meu,
que minha vida é daqueles que precisam de mim
e as letras apenas o contorno da minha alma que se traduz nas entrelinhas de um contexto poético que é a minha própria vida.

Não sei ser poeta, mas sei dizer o que é preciso.
Encontro-me em êxtase se apenas estiver com quem amo
e sei o quanto é difícil amar,
ainda que não conheça o amor,
ainda que não entenda as palavras,
ainda que o sonho seja somente sonho.
O que faz a diferença são as minhas atitudes.

Quem sabe um dia eu encontre as palavras escondidas
e enfim entenda a poesia inexplicável que se traduz em mim.


VOU ABANDONAR-ME

Vou abandonar-me nesses versos,
Desnudar a minha alma que insiste em empurrar-me
Desse precipício que é a vida.

Vou alçar voo rumo ao reino das palavras,
A clausura dos meus sentimentos
Já não é suficiente para conter
O magnetismo que me atrai a elas.

Sou andarilho nesse mundo,
Não tenho eira nem beira.


Quero apenas um papel e uma caneta,
Quero apenas uma rima bem feita
Que liberte-me para essa vida
E torne meus versos livres.


Vou abandonar-me para que outros me encontrem,
Despir-me do obsoleto,
Esquecer o perfume bucólico das lembrança
Flagelar-me sem dó na consciência
Com o amor verdadeiro e a paixão mais intensa.

Quero encontrar-me abandonado
Em qualquer canto da prateleira mais empoeirada da estante.
Quero ser esquecido para ser lembrado por cada verso de quem eu sou.

Habitarei as entrelinhas ou o rodapé de cada página,

Estarei aqui enquanto houver palavras,
Estarei ali enquanto houver leitor,
Permanecerei enquanto houver história.


PRA NÃO FALAR QUE EU NÃO FALEI DE FLORES


Pra não falar que eu não falei de flores
Faço de um poema simples, um jardim,
Um refúgio secreto dos amores,
Onde os versos são flores para mim.

Pra não falar que eu não falei de flores
Deixo a emoção florar nesses meus versos
E então pintar a vida com as cores,

Que nas folhas em branco do caderno

Dão forma ao coração que em verso assume
As palavras que exalam o perfume
Que perfuma essa vida com amores


Pois todo amor que floresce em meu peito
Revela o predicado de um sujeito
Que aqui só quer poder falar de flores.


terça-feira, 27 de março de 2012

PREFÁCIO

Bom dia a todos!


Segurando a ansiedade, publico hoje, aqui no blog, o prefácio do meu primeiro livro "NÃO SEI SER POETA", que está previsto para ficar pronto em meados do mês de abril.

Sou suspeito para falar da pessoa que escreveu o prefácio, pois além de ser uma grande conhecedora de poesias, é uma mestra sem igual e uma grande amiga. 

Com vocês Lenise Dutra que me deu a honra de prefaciar minha primeira obra literária.



PREFÁCIO
( do livro Não sei ser poeta, de Igor José) 

O verso, apenas, não basta para definir poesia. A capacidade de conceber ideias, emoção; a utilização de recursos expressivos, o uso de imagens são elementos que contribuem seguramente para a construção da sublimidade do texto poético. A construção das imagens assume forte carga poética e lírica a partir do momento em que o poeta utiliza-se da palavra para propor ao leitor que ausculte o silêncio do texto – a leitura que pode ter passado despercebida, os seus desdobramentos.

O exercício da escritura poética é uma tarefa que exige coragem e trabalho beneditino com as palavras: a poesia que provoca embriagamento da alma, que nos liberta das dores existenciais, que nos leva à contemplação da beleza dos versos. Charles Baudelaire, em Pequenos Poemas em Prosa profetiza... “É preciso estar sempre embriagado. Isso é tudo: é a única questão. Para não sentir o horrível fardo do Tempo que lhe quebra os ombros e o curva para o chão, é preciso embriagar-se sem perdão. Mas de que? De vinho, de poesia ou de virtude, como quiser. Mas embriague-se [...] É hora de embriagar-se!”. Escrever por sentir apenas, na busca do poeta pelo verso e pelo seu lirismo pessoal, o conteúdo poético das suas palavras.

Divagando em meus pensamentos/Encontro-me no êxtase de mim mesmo. Com estes versos, Igor José anuncia seu ofício: o de poetar. Não sei ser poeta, essa incursão do autor pelo universo do texto poético aponta para uma poesia anatômica em que o encontro da palavra com a emoção se faz sem melindres: elas se procuram e se coadunam sem pudor: “Hoje quem escreve não sou eu/Mas o poeta que está em mim/Minha razão e minha emoção/Estão em suas mãos/Ou melhor, em sua caneta [...]”. Seus
poemas evidenciam isto: “Não sei ser poeta, mas este poeta está em mim, busco a contemplação da liberdade poética, ando por aí, a voz da poesia faz-me escravo da liberdade [...]”. Busca, contempla, duvida.

Como Bandeira, levanta a bandeira da liberdade poética: “Abaixo às medidas e as rimas pré-elaboradas para agradar aos ditadores da língua./Soltem os versos!/Libertem os versos desse universo literário adstrito aos arcaísmos/cosmopolitas, às sintaxes de pensamentos. /Liberdade aos ingramáticos!”. Seguindo Pessoa na pessoa de Álvaro de Campos, “Eu sou o que sou, o que faço é problema meu”, rejeita qualquer forma de exigência em busca do lirismo que aprisiona, que não seja libertário. Ou ainda, acompanhando os passos de Augusto dos Anjos, questiona a própria existência, escreve por palavras, mas suas palavras parecem ganhar vida, ali há um coração pulsando “... Mas caí como um verme / No centro de um lixão,/ Sinto-me mais que um nada/ Rastejando na rua./ Estou sentindo nojo, / Do meu eu me despojo,/ Um verme sei que sou!”. É fisiologia em palavras. Mantém, para sua escritura poética, os olhos voltados para os poemas dos mestres. Um poeta de muitas vozes e de muitas faces, como Drummond. A este dedica seu DRUMMOND: “Olho para o rosto do mestre/Escondidos por detrás dos óculos /Seus olhos me encontram”. A poesia de Igor mantém com a poesia de Drummond um namoro silencioso: “Folheio a sua biografia/ Encontro-me com um José/ Assim como eu e tantos outros.”

Chamo de singular o poeta Igor José, o verso é sua matéria. Os poemas estão na ponta língua prontos para serem degustados pelo leitor. Talvez sofra dos males dos românticos... Insônia, desejo, sonho, lirismo; talvez incorpore a ideologia dos modernistas na busca do verso sem aprisionamentos, sem medidas. O que importa é a feitura do texto, sem apelos temáticos e estruturais. Em sua poesia cabem os sonhos, as dores, o amor, o medo, a desilusão, o ofício.

Crescem juntas a poesia e a emoção de Igor José: brotam da mesma fonte, correm em leitos paralelos e encontram-se. É a vida, o lado oculto e individual do poeta, que pulsa em sua poesia repleta de lirismo. Sua poeticidade se manifesta no fato de a palavra ser sentida como palavra e não como simples substituto de um objeto ou de uma emoção.

Enfim, mostra-se, e na sua urgência deixa para o leitor a tarefa de decifrá-lo, ora como o monstro que habita o porão da alma, ora como um passarinho que foge de sua gaiola.


Profª Ms. Lenise Ribeiro Dutra de Campos 
Mestra em Literatura Brasileira 
Especialista em Língua Portuguesa 
Graduada em Letras

segunda-feira, 26 de março de 2012

Verconda Espadarote Bulus

Hoje homanegeio aqui no blog Verconda Espadarote Bulus, cujo lirismo e romantismo conseguiram atingir-me a alma. Recomendo! É uma ótima leitura.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Paulo Leminski

Mal-aventurados os que se rendem às verdades absolutas sobre Jesus. Se foi reformador ou revolucionário, fariseu dissidente ou profeta iluminado, nada disso nos contam os Evangelhos. Jesus sabia se esconder bem entre as muralhas e as palavras. Indiscutível apenas é que sua doutrina tomou o poder no Império Romano sem levantar uma espada. 

Entender suas parábolas é mergulhar num emaranhado de significados que se multiplicam como os peixes do milagre evangélico. Peixes, símbolo de subversão da ordem vigente. 

Ler Jesus é caminhar sobre as águas incertas, que vêm com força e quebram em ondas de interpretações. Nas praias, porém, só existe a certeza de que ele era um superpoeta.

sábado, 3 de março de 2012

Francis Schaeffer para o Século 21




Na semana passada um dos mais importantes personagens evangélicos do século XX fez o seu aniversário de cem anos: Francis August Schaeffer. Nascido em 30 de Janeiro de 1912 em Germantown, Pennsylvania, num lar completamente secularizado, Schaeffer viria a exemplificar uma espécie nova e, para muitos, incompreensível de vivência da fé evangélica, tornando-se o “apóstolo dos intelectuais”, como foi descrito pela revista Times em 11 de Janeiro de 1960, e para muitos um profeta para o cristianismo do século 21.

Haveria muito o que dizer sobre Francis Schaeffer e o impacto de sua obra hoje, e eu até pretendo fazê-lo em algum momento, mas vamos nos limitar dessa vez a uma pergunta sobre a sua relevância. Schaeffer é, realmente, atual? Vale a pena ouvir de novo sua voz no mundo contemporâneo e no Brasil de hoje?

Essa pergunta tem sido feita frequentemente por estudantes aqui em L’Abri, e acabei descobrindo que em boa parte das vezes ela não vem da cabeça dos próprios estudantes – que via de regra, sentem-se muitíssimo ajudados por Schaeffer. Na verdade o que acontece é que eles leem Schaeffer mas ao citá-lo são “informados” por alguns líderes mais antigos que Schaeffer teria sido “passado” – o que parece ser realmente uma situação muito irônica: os novos considerando Schaeffer “atual”, e os antigos o considerando “ultrapassado”.

Schaeffer Ultrapassado?

Estou com os que consideram Schaeffer crucial para a igreja evangélica brasileira no século XXI, e não se trata de provocação saudosista; na verdade eu mesmo não pertenço à geração de Schaeffer, nem às gerações imediatamente posteriores. Eu acabei de chegar. Mas alguns dos primeiros leitores de Schaeffer, que reconheceram sua atualidade – há quarenta, trinta, vinte anos atrás – agora estão certos de que Schaeffer é passado. “Schaeffer descrevia uma condição ainda moderna, superada pela posmodernidade”, já ouvi. Alega-se que sua ênfase na “verdade verdadeira” (true truth) denuncia uma visão racionalista da revelação, que ele seria biblicista, que tentar misturar religião com tudo seria “integrismo religioso”.

Sem falar em outros problemas: sua explicação da história das idéias no ocidente seria simplista, e particularmente suas críticas ao dualismo de Natureza e Graça em Tomás de Aquino e ao “salto irracional” de Soren Kierkegaard. Com base na redescoberta desses e de outros pensadores ou líderes culturais examinados por Schaeffer, alguns decidem “avançar”, dando “um passo à frente”.

Eu não li Schaeffer quando ele “foi relevante”; eu li agora, ontem. Mas cada vez mais cresce em mim a suspeita de que alguns de seus leitores antigos erraram tanto na compreensão de Schaeffer como da transformação da cultura ocidental na segunda metade do século XX. Quando falava de “modernidade moderna” e do cruzamento da linha do desespero, Schaeffer não descrevia meramente o “fim” da modernidade, mas a nova configuração que começou ali, e na qual estamos mergulhados agora. O que alguns chamam de posmodernidade, mas que é melhor descrito com a expressão “hipermodernidade” é exatamente a realização das profecias de Schaeffer sobre o colapso da identidade humana e a perda da imagem humana, do que o existencialismo foi apenas um estágio inicial.

E tem mais: Schaeffer é relevante para o Brasil. E isso por uma razão até evidente: o evangelicismo brasileiro foi estruturado à imagem e semelhança do evangelicismo anglo-saxônico, trazendo em seu DNA as mesmas fragilidades genéticas de seus pais. Gostando ou não somos herdeiros dos problemas que Schaeffer tentava curar, e agora que chegamos à adolescência no Brasil, a mesma história está se repetindo em nossa pele. E enquanto a teologia evangélica latino-americana não encarar esse fato, ela continuará irrelevante.

Da minha posição de novato nos debates teológicos, confesso não ver sentido algum em um velho teólogo ou líder evangélico brasileiro dizendo que foi ajudado por Schaeffer, quando quase se tornou existencialista e mergulhou no absurdo, mas que agora ultrapassou Schaeffer e tornou-se… existencialista, para todos os fins práticos! Acho que isso seria melhor descrito com a expressão “retrocesso“. Pois nisso o mundo não mudou, não passou por nenhuma revolução: a hipermodernidade continua firme na mesma direção, com a dissolução dos universais, a cristalização de uma cultura de de prosperidade, bem estar e entretenimento, a pulverização individualista do homem, o fortalecimento de instituições de controle para compensar a falta de virtudes compartilhadas, e assim por diante.

A bem da verdade, o mundo mudou com as transformações do sistema de consumo, de informação e de comunicação, principalmente pela internet, mas essas são revoluções dentro da revolução. A verdadeira revolução foi uma mudança espiritual muito maior que teve início no século XIX com o colapso do projeto moderno anunciado pela filosofia, pela literatura e pelas artes e materializado mais recentemente no restante da estrutura das sociedades modernas.

Ainda a “Mannishness”

Sim, preciso dar exemplos. Quero começar com um ponto central das preocupações de Schaeffer: o problema da mannishness, a “hombridade do homem”, ou mais precisamente a sua hominalidade. Segundo Schaeffer seria impossível preservar a imagem humana sem uma relação explícita e vital com o Deus de Jesus Cristo e da história Bíblica. Schaffer argumentou ao longo de suas obras apologéticas, como “O Deus que Intervém”, “O Deus que se Revela”, “A Morte da Razão” e “Como Viveremos”, que a imagem elevada do ser humano acalentada pelo Renascimento do século XIV era derivada do cristianismo, e que ao recusar a necessária conexão entre essa imagem humana e a imagem divina em nome da autonomia absoluta, o homem moderno fracassaria – como de fato fracassou - em manter a dignidade do homem. No século XIX teria emergido claramente a contradição moderna entre a visão do homem como uma máquina, fruto de processos naturais impessoais e objeto de manipulação tecno-científica, e o ideal de homem como indivíduo livre, capaz de se autodeterminar e de expressar a si mesmo na arte e na moralidade.

 O problema, segundo Schaeffer, é que o homem, ou é máquina impessoal, ou é pessoal e livre. Sendo comprometido, por um lado, com a visão moderna e cientificista de que o universo é essencialmente impessoal (com o propósito de afirmar autonomia frente à religião), mas ao mesmo tempo sentindo, desejando e afirmando em si mesmo a sua transcendência pessoal e sua liberdade em relação à natureza (afinal, a imagem divina continua presente nele), o homem moderno entrou em colapso, “deu tilt”, por assim dizer. Ele segue dois comandos contraditórios. E a solução escolhida no século XX foi “cruzar a linha do desespero” e dar o “salto irracional”. Como? Procurando encontrar o sentido da vida em algum tipo de experiência emocional, ou sensorial, ou numa expectativa utópica sem conexão com a racionalidade. A espiritualidade continua presente, mas separada do campo da “razão”, e ao mesmo tempo sendo manipulada por uma elite que emprega uma racionalidade instrumental.

O homem moderno – e agora, hipermoderno – vive portanto uma contradição: sua visão da realidade nega a existência de liberdade, verdade e significado, mas ainda assim ele se lança em busca de experiências que produzam algum tipo de significado e uma confirmação de que ele é alguém. O problema é que essas experiências não são avaliadas segundo um padrão de verdade; assim todo tipo de experiência é considerado uma alternativa viável, desde uma igreja evangélica a uma balada, de um investimento no esporte ao consumo de drogas. Minha esposa teve uma professora na faculdade que era espírita e marxista roxa, e ela não era uma exceção.

Agora a pergunta: o que mudou? Não é verdade que o homem está cada vez mais alienado de si mesmo, e que o valor singular da pessoa humana é simultaneamente afirmado (na política dos direitos humanos, na educação, no cinema, no entretenimento secular e religioso, no ideário político professo) e sistematicamente negado (no individualismo atomizante das políticas de direitos humanos, no reducionismo das hard-sciences, no sistema do capitalismo de consumo, na nova bioética, e no “entretenimento cult”)?

Ainda a “Linha do Desespero”

Vários desenvolvimentos mais recentes no campo das artes, do entretenimento, da política, da moralidade pública e da economia confirmam o quadro pintado por Schaeffer. Na academia, por exemplo, a contradição entre o naturalismo determinista e o construtivismo social e antropológico em diversas ciências humanas continua viva como sempre (e a propostas para superação dessa lacuna continuam na ordem do dia). Vide a polarização entre a interpretação sociobiológica do humano e as abordagens feministas e a teoria Queer no estudos de gênero e sexualidade. Na política temos o esforço do Estado em ampliar e proteger os direitos individuais, ao mesmo tempo em que a vigilância e o controle estatal sobre a sociedade aumenta – um aspecto do processo de atomização social tão bem descrito por Charles Taylor. Exemplos disso poderiam ser apontados e cada área da vida moderna.

Mas em poucas áreas termos evidência mais clara disso do que no campo do entretenimento hipermoderno. Um exemplo particularmente interessante para mim são as novas megafestas, ou neofestas, como a Tomorrowland, Sensation (Skol Sensation no Brasil), Creamfields, entre outras. O caso da Sensation (cf. o link: http://www.youtube.com/watch?v=vIuRrG-ZCDY) é emblemático: o nome é muito direto, e também o programa das festas, com narradores e vinhetas destinadas a afirmar a possibilidade de transformação humana, autotranscendência, unidade humana e paz por meio de uma experiência de liberação das pulsões mais fundamentais. Mas em cem por cento dos casos, essas experiências são produzidas por meio de recusos altamente técnicos. E que isso aconteça ao mesmo tempo em que o neoateísmo cresce no mundo é uma clara confirmação de que as tensões e tendências apontadas por Schaeffer estão cada fez mais definidas e influentes no mundo.

E o mesmo não acontece no interior do movimento evangélico? O cultivo da espiritualidade é quase totalmente associado com experiências de sensação e excitação de massa, e ao mesmo tempo – de fato ao mesmo tempo! – boa parte dos novos líderes orgânicos do movimento evangélico emprega abordagens tecnicistas para lidar com o desespero de seu público; e os mais intelectualizados acolhem interpretações modernizantes do cristianismo, abandonando elementos fundamentais da fé evangélica como a crença na autoridade bíblica, na soberania de Deus, na necessidade da expiação substitutiva, ou até mesmo seguindo opções absolutamente incompatíveis com a fé evangélica, como o sistema de Paul Tillich, idéias libertárias e anarquistas (sejam elas de esquerda ou representantes do anarcocapitalismo), ou as velhas, insistentes e impossíveis sínteses de cristianismo e marxismo.

A aceitação dessa ruputra doentia entre verdade e esperança, ou entre racionalidade e experiência religiosa deixa à mostra a condição de desespero, de todos nós, incrédulos e crentes, no princípio do século XX. Todos sofrem de uma terrível e idêntica ansiedade: a perda do real; o sentimento de que tudo é artificial, precário e “não chega lá”; de que a verdade da universidade não é a “minha” verdade, e que a “minha” não é de ninguém; e que a imagem que contemplamos o tempo todo talvez seja apenas a nossa própria imagem refletida num espelho. Temos, sim, momentos de esquecimento que nos ajudam a sobreviver, mas de tempos em tempos somos de novo assaltados por essa náusea tipicamente hipermoderna de que no fim não há ligação entre esperança e racionalidade. Ou você tem um, ou você tem o outro.

Esses momentos de náusea são, no entanto, momentos de realidade. Não que o mundo seja realmente assim, mas que essa condição escolhida por nós é insustentável. O homem vive em desespero porque insiste no caminho contraditório do humanismo secular, e mostra o seu desespero em cada salto irracional para encontrar significado, mas apenas sente o desespero quando vê em si a contradição. E a tarefa numero um do apologista cristão não seria provar a verdade do cristianimo, mas ajudar o homem hipermoderno a voltar para a realidade. E nesse ponto, a náusea hipermoderna é a melhor amiga do evangelista.

Ainda “L’Abri”

É aqui que a comunidade L’Abri se encaixa. Os estudantes brasileiros de Schaeffer – como os americanos – tendem a concebê-lo como sendo, basicamente, um apologista reformado, da escola pressuposicional, herdeiro de Cornelius Van Til, mas que introduziu modificações (distorções, para alguns) tentando integrar o pressuposicionalismo com elementos de apologética evidencialista tradicional.

Pessoalmente considero essa discussão fascinante e teologicamente importante, mas sempre me sinto incomodado com a falta de perspectiva com que ela é conduzida. Pois a apologética de Schaeffer não era fundamentalmente um sistema teológico-filosófico, mas um modo de vida, e por isso L’Abri era tão importante. A comunidade L’Abri (“o abrigo” em francês), fundada por Francis e sua esposa Edith Schaeffer na Suíça em 1955 é, por assim dizer, a “encarnação” de sua apologética, sendo impossível compreender um coisa sem a outra. E uma das idéias constantemente cultivadas em L’Abri para comunicar essa conexão é a de “realidade“.

Quando Schaeffer falava sobre “true truth” (verdade verdadeira) seu ponto não era apenas afirmar que existe verdade com “V” maiúsculo dentro do discurso racional, ou que o cristianismo seja verdadeiro porque é racional; a verdade para Schaeffer era antes de tudo a realidade das coisas. Por isso em L’Abri o termo “cosmovisão” (worldview) nunca teve um lugar excepcionalmente importante. O cristianismo, segundo Schaeffer, não era tão somente a melhor cosmovisão, ou o “sistema” verdadeiro, mas um retorno à realidade de Deus, do mundo e do homem. E realidade não é algo que se possa mostrar meramente dentro de um discurso filosófico ou apologético. Realidade é algo que precisa ser demonstrado. Um cristianismo autêntico e demonstrável na prática é o tema do best-seller “A Verdadeira Espiritualidade”, de Schaeffer, considerado pelos obreiros de L’Abri como a sua obra mais importante, superando todos os outros livros.

Aqui entra o que Os Guiness (ex-obreiro de L’Abri) descreveu como “o segredo de L’Abri”: Edith Schaeffer. Ela não aparece muito nos livros de Schaeffer, mas sem ela não haveria Schaeffer, nem livros, nem L’Abri. Sua combinação de hospitalidade, alegria, vitalidade na oração e trabalho duro faziam a alma do lugar e formaram o ethos das mulheres de L’Abri. E ela escrevia também; pouca gente sabe que seus diversos livros venderam quase um milhão de cópias! Edith nos deu uma das melhores descrições de L’Abri:

Aqueles de nós que desejam viver à luz da existência de Deus, e que desejam levar vidas equilibradas sobre a base da verdade quanto ao que existe e também de quem nós somos, devem estar conscientes de que a atmosfera e o ambiente ao nosso redor foi poluído, e que precisamos de algum tipo de discernimento, algo talvez como como uma ‘máscara de gás’, para peneirar idéias e compreensões, de modo a não ficarmos pervertidos ou sufocados (Duriez, Francis Schaeffer, p.133).

A a finalidade de L’Abri é a demonstração da realidade de Deus, em dois sentidos: primeiro, por uma vivência rica de significado, na qual verdade e esperança surjam reunidas. Por isso, mais do que um centro de estudos, L’Abri é um centro de hospitalidade, no qual a pessoa é recebida e considerada em sua integridade humana. Ao experimentar reflexão, diálogo, comida, trabalho, beleza, arte, descanso, oração no contexto da verdade cristã total, a pessoa pode reconhecer o significado de ser integralmente humano na presença de Deus; e ao mesmo tempo percebe o quão insuficientes são os caminhos do homem para obter essa experiência. Esse é o lado, digamos “humanizador” de L’Abri; Hans Rookmaaker dizia que Cristo não veio chamar homens para se tornarem cristãos, e sim para tornar os cristãos humanos.

Mas essa experiência integrada da nossa humanidade não pode ser descoberta sem Deus. Por isso a verdade e a oração são inseparáveis em L’Abri; como costumamos dizer, a própria existência de L’Abri depende da oração. Semanalmente todos os L’Abris realizam suas reuniões de oração apresentando pedidos específicos e aguardando respostas específicas – incluindo a própria manutenção de L’Abri, já que por princípio não temos um sistema de captação de recursos. A história de L’Abri está recheada de respostas de oração; e temos testemunhado disso no L’Abri Brasil, desde o início. Na primeira vez em que um representante de L’Abri internacional foi convidado para o Brasil não tínhamos um tostão para pagar as passagens. Mais tarde Andrew Fellows, atual diretor internacional, relatou que o convite fora uma resposta às orações dele mesmo, há anos com a mente voltada para o Brasil; mas eles não tinham um tostão para pagar as passagens. Na mesma semana, no entanto, sem saber de nada, alguém telefonou para ele oferecendo uma ajuda financeira com um propósito absolutamente atípico: “a expansão de L’Abri no mundo”.

Até hoje L’Abri mantém a fragilidade porque essa é a sua identidade. Schaeffer dizia que o L’Abri deve ser frágil o suficiente para fechar quando Deus não o quiser mais. Não é o tipo de trabalho que possa ou deva existir de forma automática, mesmo que sua essência seja perdida. Literalmente não sabemos se L’Abri Brasil vai durar mais um ano, e é assim que tem que ser; dependemos de Deus e das pessoas que ele levanta para apoiar o ministério.

E por isso L’Abri não acabou com a morte de Schaeffer; porque, literalmente, Deus quis que L’Abri existisse por mais algum tempo (não sabemos quanto), e mesmo quando não houver mais L’Abri, aquilo que a comunidade representa nos onze centros espalhados pelo mundo continua sendo absolutamente essencial: a demonstração da realidade de Deus. Essa demonstração tem o poder de trazer as pessoas de volta à realidade, da qual a sociedade hipermoderna sente uma sede imensa, mas da qual foge com todas as suas forças. Essa demonstração da realidade de Deus no pensamento, na espiritualidade, nos relacionamentos e na missão da igreja continua essencial, e continua um problema no cristianismo evangélico contemporâneo, assim como foi em 1955.

Ainda a “Verdade Verdadeira”

A perda da realidade está também por trás da atual crise evangélica. O próprio Francis Schaeffer teve uma grande crise de fé antes de iniciar o trabalho na década de 50, quando ainda era um missionário do Concílio Mudial de Igrejas Cristãs – uma organização fundamentalista que se opunha ao ecumênico “Concílio Mundial de Igrejas”. Schaffer chegou à conclusão de que o seu modo de pregar o evangelho, sem nenhum diálogo ou esforço de compreensão do homem moderno era totalmente falho; ele estava comunicando “verdade sem amor”. A existência de L’Abri se deve em grande medida à decisão de manter Verdade e Amor inseparavelmente conectados; podemos até discutir intensamente com um descrente ou com um crente em crise, mas tudo mundo se essa conversa honesta for feita dentro da sua casa, num contexto de hospitalidade, e sabendo que no outro dia nos veremos novamente no café da manhã.

Nunca, no entanto, Schaffer entendeu que o amor genuíno pudesse ser sustentado sem a “verdade verdadeira”, e isso sempre esteve no centro de sua agenda. Em uma conferência pouco antes de morrer ele foi perguntado sobre qual seria a razão para ser cristão, e sua resposta inequívoca foi: “há uma, e apenas uma única razão para ser cristão, e é a convicção de que essa é a verdade sobre o universo” (Duriez, Francis Schaeffer, p. 109). Na verdade ele dizia isso sempre, como testemunha Udo Middelmann e outros obreiros de L’Abri.

Schaeffer sabia o que dizia; seu caminho para a verdade não fora feito apenas de convicções aprendidas de outros. A crise de Schaeffer não foi causada apenas pela constatação de que o evangelho pregado pelos fundamentalistas carecia de amor e realidade, mas porque ele próprio sofreu dúvidas terríveis sobre a veracidade da fé cristã. E em L’Abri ele sempre deixou claro que a dúvida era uma coisa boa. Uma vez com dúvidas, precisamos ir até o fim com elas – não podemos simplesmente colocá-las de lado. Udo Middelmann observou mais de uma vez que Schaeffer não buscava apenas uma “perspectiva cristã”, mas a verdade, não a melhor teoria, mas um retorno à realidade das coisas, e isso implicava fazer perguntas honestas, duvidar de forma honesta, manter-se vulnerável. Mas sustentar tanto a crença como a dúvida apenas por razões políticas não passava, para ele, de hipocrisia.

Aparentemente uma parcela dos líderes evangélicos atuais se esqueceu da importância da verdade, escorregando para uma ou outra forma de pluralismo, ou negociando sínteses perigosas entre a fé evangélica e a mente secular. Um exemplo notável foi o recente movimento “emergente” (hoje quase submerso). Alguns representantes da igreja emergente, inclusive no Brasil, chegaram a comentar publicamente que o tipo de ênfase na “verdade” que Schaeffer destacava pertence a um momento passado, ainda moderno, o que revelou uma profunda incompreensão de Schaeffer; a situação descrita por ele como a “linha do desespero” é exatamente a antecipação do posmodernismo, que agora está na ordem do dia. A cobra que Schaeffer apontava já passou por nós, e vários de nós foram picados por ela. Apenas nesse sentido ele foi “ultrapassado”: é que suas profecias se realizaram.

Assim como o liberalismo teológico antigo, setores da neo-ortodoxia e teologias hermenêuticas contemporâneas como a de Paul Tillich, agora os próprios líderes evangélicos praticam abertamente o “misticismo semântico”, empregando os termos teológicos clássicos mas atribuindo significados corrompidos pelo humanismo secular ou completamente novos. Isso acontece claramente com muitos teólogos evangélicos que se formaram em ciências da religião nos últimos anos (sem preconceitos, já que essa é a minha formação também). E mesmo onde se alega a adesão ao cristianismo histórico, a teologia cristã é reduzida e vinculada tão somente a um conjunto minúsculo de significados, associado a experiências emocionais na adoração gospel, ou à responsabilidade social da igreja no âmbito de uma interpretação esquerdista da missão integral. Para muitos olhares atentos já temos sinais suficientes de que o movimento evangélico perdeu a única coisa que daria sentido e razão de ser a si mesmo: o próprio evangelho. O movimento vem sendo “esticado” entre o pluralismo teológico, a teologia da prosperidade, o êxodo dos sem-igreja (segundo o IBGE) e, agora, o crescente interesse por um retorno ao catolicismo romano.

Uma das maiores necessidades da igreja evangélica hoje é a sua própria reevangelização, mas para isso o próprio cristianismo precisa ser redescoberto em seu caráter de “verdade total”. É preciso não apenas recuperar a riqueza de significado da teologia protestante no contexto da piedade evangélica, mas também estabelecer uma clara conexão entre essa verdade e a realidade das coisas, desvelando seu sentido prático e existencial. Para tanto precisamos duvidar, tanto da crendice à direita (na “cultura Gospel” brasileira) como do cinismo à esquerda (do pensamento evangélico semi-liberal). Os líderes cristãos que desistem de ser evangélicos desistindo da “verdade doutrinária” e rindo da “ortodoxia” não são soluções, mas partes do problema.

Ainda a Unidade de Natureza e Graça

Segundo a citação que fizemos de Schaeffer, o cristianismo é uma verdade total. Não apenas a verdade sobre Deus e a salvação, mas a verdade sobre o mundo, o homem, a cultura, o passado e o futuro. E em seu melhor momento, a fé protestante manteve essa conexão na forma de uma unidade de Natureza e Graça. Com isso Schaeffer quis dizer que para os reformadores a Graça não era um mero complemento à uma “natureza” que seria basicamente boa e funcional. Sendo agostinianos nesse ponto, os reformadores reconheceram que a Queda afetou completamente a Natureza, e que mais que um complemento, a Graça deveria penetrar internamente e redimir toda a Natureza.

Em outras palavras, a mesma mensagem monergista de uma salvação gratuita e completa desdobrou-se em uma afirmação do valor da revelação bíblica para todos os campos da vida, de forma integral. E essa perspectiva foi perdida pelo movimento evangélico, principalmente a partir de suas raízes pietistas que, não surpreendentemente, apresentavam traços pelagianos. Já no século XIX a noção de uma separação entre a “vida religiosa” e a “vida secular” se tornara um lugar-comum no discurso evangélico. Esse dualismo se alojou na teologia, na espiritualidade, e na missiologia evangélica, sendo desafiado apenas depois da Segunda Grande Guerra, com figuras como Carl Henry, Francis Schaeffer, John Stott e, embora parcialmente, com o Pacto de Lausanne. Continuamos mergulhados até o pescoço nisso, aqui no Brasil. Há, aqui e ali, teólogos que tentam lidar com o problema, mas a massa dos crentes vive existências completamente compartimentadas, isolando “vida espiritual” e “vida secular”.

A experiência do cristianismo não como evasão, mas como retorno à realidade, depende desse cristianismo ser claramente ensinado e praticado como unidade de natureza e graça, com a graça penetrando todas as esferas da natureza. Isso envolve mais do que a “responsabilidade social da igreja”; envolve a vivência estética, a vida intelectual, a experiência comunitária, e também áreas sensíveis como economia e política. Mas para reconstruir essa relação integral com o mundo que o cristianismo exige, é preciso restaurar o evangelho da Graça em sua integridade, e para tanto será preciso um retorno ao protestantismo primitivo, com sua ênfase monergista na Graça salvadora de Deus. Esse era um ponto essencial, implícito no chamado profético à igreja evangélica em seu tempo; e embora com algum atraso, muitos agora reconhecem que essa é a solução. É o que vemos em iniciativas como Desiring God Ministries, The Gospel Coalition, Rede Atos 29, Editora e Conferência Fiel, e na multiplicação de jovens pastores reformados em diversas denominações evangélicas. Falta apenas os novos reformados compreenderem as implicações cosmológicas e culturais do monergismo, o que nem sempre acontece.

Profeta ou Erudito? Que tipo de pensador era Schaeffer?

Alguns leitores de Schaeffer reconhecem sem dificuldade a realização quase profética dos vaticínios de Schaeffer sobre o mundo atual, mas sentem-se incomodados com a ausência de um rigor maior em suas teses; o maior incômodo relaciona-se normalmente às suas críticas contra Kierkegaard, Hegel e Tomás de Aquino. Há quem descarte Schaeffer por conta delas.

A crítica à crítica de Schaeffer contra Kierkegaard é sem dúvida válida; não é totalmente claro que Kierkegaard tenha sido o responsável pelo “salto irracional” existencialista. Mas isso não importa tanto quando reconhecemos que o movimento existencialista realmente foi o primeiro a cruzar a “linha do desespero” que Schaeffer descreveu tão bem. Talvez o principal responsável pelo existencialismo tenha sido F. W. J. Schelling (como argumenta Paul Tillich); talvez Kierkegaard tenha sido lido já no contexto irracionalista do existencialismo do século XX e incorporado de forma errônea; ou tenha sido alvejado por associação, quando a neo-ortodoxia era atacada por separar o sentido da revelação dos fatos espaço-temporais. Mas que a “linha do desespero” estava lá, e que já estamos do outro lado dela, é simplesmente um fato. Hoje em L’Abri temos empregado Kierkegaard constantemente, e de forma criteriosa, ao lado de Schaeffer.

Quanto às alegações de Schaeffer de que Hegel teria sido o principal responsável pela negação da antítese entre verdade e falsidade, isso é também bastante plausível. A lógica dialética aplicada à história fez exatamente isso; e pensadores posmodernistas atuais como Richard Rorty reconhecem publicamente que o historicismo de Hegel foi uma das principais fontes de sua convicção de que não existe verdade dentro da história, mas apenas no processo histórico. O que falta para compreender Schaeffer aqui é o entendimento do motivo subjacente à dialética Hegeliana, que seria a busca de uma lógica capaz de superar o dualismo de Natureza e Liberdade cristalizado em Immanuel Kant – um dilema central da filosofia alemã, tanto idealista quanto materialista. Foi a contradição estrutural do pensamento moderno que levou à crise da racionalidade, e Hegel representou uma das estações dessa crise; o passo seguinte seria o existencialismo.

O mesmo vale para a suspeita de que Tomás de Aquino não seria responsável pelo domínio do dualismo de Natureza e Graça – a separação entre o campo da razão e do mundo “secular”, e o campo da fé e das coisas sobrenaturais. A comparação entre Schaeffer e Tomás mostra um desnível em articulação e erudição tão grande que é fácil suspeitar que Schaeffer pode ter sido simplista. Mas apenas se o leitor conhecer apenas Schaeffer e algo de Tomás de Aquino; pois a divergência entre a concepção protestante primitiva de Natureza e Graça e a concepção Tomista a respeito é uma observação teológica muito mais antiga que Schaeffer, e plenamente reconhecida na erudição protestante como estando ligada à divergente apropriação do agostinianismo. Os protestantes enfatizavam a prioridade da Graça de forma monergista, assim como a depravação total do homem na Queda, e isso os levava a suspeitar de qualquer autonomia da natureza – seja em termos de racionalidade filosófica, seja em termos de méritos para a salvação. E ainda que Tomás tenha apenas herdado esse dualismo, ninguém deu a ele uma forma mais filosoficamente bem articulada.

Algo mais deve ser dito aqui, no entanto; as teses de Schaeffer sobre o dualismo de Natureza e Graça e de Natureza e Liberdade em Kant, Hegel e Kierkegaard, expostas de forma resumida em “A Morte da Razão” tiveram sua origem em uma escola muito maior e erudita de pensadores cristãos ligados à tradição neocalvinista, do Estadista e Reformador holandês Abraham Kuyper. O segundo homem de L’Abri foi o filósofo e historiador da arte Hans Rookmaaker, que por sua vez foi discípulo do jurista e filósofo holandês Herman Dooyeweerd, e temos boas razões para acreditar que grande parte da leitura de Schaeffer sobre esses assuntos foi derivada de Dooyeweerd via Hans Rookmaaker (além, é claro, de Cornelius Van Til, professor de Schaeffer nos tempos de seminário).

Dooyeweerd era um erudito enciclopédico, membro da Academia Real Holandesa de Ciências e presidente da várias sociedades científicas em seu país; e ele descreveu tanto o dualismo tomista de Natureza e Graça como a origem e evolução do dualismo de Natureza e Liberdade em obras mais simples como “No Crepúsculo do Pensamento Ocidental” (que traduzimos para o português), em intermediárias, como “Roots of Western Culture” (Raízes da Cultura Ocidental) e nas mais eruditas como “A New Critique of Western Thought” (Uma Nova Crítica do Pensamento Ocidental) e “Reformation and Scholasticism in Philosophy” (Reforma e Escolasticismo na Filosofia). E além de Dooyeweerd, muitos outros eruditos protestantes da escola “Wetsidee” holandesa (a corrente filosófica fundada por Dooyeweerd) se debruçaram sobre o tema com conclusões semelhantes.

Ninguém deve pensar, portanto, que o ataque de Francis Schaeffer aos dualismos que corrompem a presença cristã no mundo podem ser ignorados apenas pela falta de notas de rodapé em seus livros; seus insights nesse campo se apóiam sobre os ombros de alguns gigantes da erudição cristã do século XX, e para uma compreensão mais profunda de Schaeffer é essencial consultar suas fontes. A minha própria consulta me tem feito confirmar a estrutura básica do argumento de Schaeffer.

Sem dúvida não se pode ler a obra de Schaeffer como se lê, por exemplo, Thomas Torrance, W. Pannenberg, Alister McGrath ou D. Carson, entre os teólogos atuais, ou Charles Taylor, Alvin Plantinga, Nicholas Wolterstorff ou Richard Swinburne, no caso dos filósofos cristãos atuais. Schaeffer não se encontra na lista dos grandes eruditos cristãos. Mas é um erro lê-lo assim; ele jamais reivindicou essa posição. O valor de Francis Schaeffer não está na meticulosidade de sua erudição, mas em seu extraordinário insight espiritual, muitas vezes comunicado de forma imprecisa e questionável, mas ainda assim, imensamente esclarecedor. Schaeffer é um mestre de espiritualidade com uma abordagem genuinamente pós-iluminista; talvez um dos poucos que temos assim. Ele escreve sobre espiritualidade cristã e evangelização genuína no mundo de hoje, em termos de como esse mundo funciona, confrontando a mente moderna/hipermoderna e mostrando com clareza a verdade do evangelho. Sob esse ponto de vista, continua sendo uma preciosidade.


REFERÊNCIAS

Colin Duriez, Francis Schaeffer: an authentic life. Nottingham: InterVarsity Press, 2008.
Bruce A. Little, Francis Schaeffer: a mind and heart for God. P&R Publishing, 2010.
Michael S. Hamilton, The Dissatisfaction of Francis Schaeffer. Christianity Today, March 2997. (Disponível em: http://www.christianitytoday.com/ct/1997/march3/7t322a.htm)

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Manifesto contra uma cultura brasileira sem direção


Por Igor José 

Chegamos à segunda década do século XXI, O futuro da humanidade, hoje totalmente dependente da modernidade tecnológica, é um mistério. A roda do sistema conduz o homem pela vereda da vida rumo a um futuro desconhecido, onde as informações chegam a velocidades indescritíveis e a globalização é mais do que uma mera palavra usada para traduzir a união dos povos, mas a realidade de um mundo que miscigena ideias como um grande caldeirão efervescente onde as opiniões se unem ou se chocam sejam elas referentes à economia, política, fé ou cultura, e assim novas tendências e conflitos vão surgindo.

Culturalmente o Brasil se traduziu, durante um longo tempo, muito suficiente na literatura modernista, que com uma visão futurista, rompeu a barreira do tradicionalismo e mesmo com influências importadas, principalmente da frança, conseguiu obter uma identidade adquirida como uma carta de alforria, assinada por Graça Aranha, na Semana de Arte Moderna de 1922.
 
Entretanto, essa liberdade tão desejada no início do século XX, para se criar novos textos, com novas técnicas e propostas, conseguidas a custo de uma ruptura brusca com as escolas literárias anteriores e ampliada no decorrer dos anos seguintes, agora no auge dos seus noventa anos, se perde na era tecnológica que domina o mundo, devido um conhecimento superficial (ou falta dele) das lutas modernistas e sua finalidade por parte, principalmente dos jovens, que não se interessam pela arte literária mais nacional que artistas brasileiros já produziram.

Como professor de língua portuguesa, confesso me sentir um pouco perdido com relação a tudo isso. Sinto-me despreparado para participar da evolução cultural do meu país, diferentemente daqueles que lutaram pelo rompimento das artes com o tradicionalismo e as tendências europeias; dos jovens que lutaram contra a revolução de 1930 e dos que combateram o golpe militar de 1964, que se engajavam politicamente em prol do país em todas as áreas, principalmente a da liberdade cultural. Contudo as gerações passam e fica apenas o legado. E é essa herança que permanece nos livros, nos jornais e na internet para que nós, os novos responsáveis pela língua, pela literatura e pela arte em geral, não deixemos que a nossa identidade cultural se perca, mas que a nossa brasilidade se fortaleça numa renovação de ideias que se traduzam nas artes das mais variadas e no modo de ser brasileiro.

Hoje faz-se necessário voltar ao passado, conhecer os ideais de ontem para que assim possamos reorganizar o pensamento e as idéias que surgem nessa nova era em que a humanidade se encontra, e com isso afetar todas as áreas da sociedade moderna, evocando o comprometimento, a sabedoria e o lirismo dos mestres que hoje sobrevivem em suas obras, por poucos apreciadas, pela falta de curiosidade, pela falta de responsabilidade, pela falta de respeito com si mesmo, com a sociedade e com a pátria.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

O HOMEM DO LIXO

A mulher senta-se pesadamente no banco e coloca uma sacola cheia de coisas sem valor entre os pés. Apoiando os cotovelos nos joelhos e o rosto nas mãos, ela observa a calçada. Em seu corpo, tudo dói. Costas, pernas, pescoço. Seus ombros estão rijos e sua mãos, esfoladas. Tudo por causa da sacola.
Oh! se ao menos pudesse se livrar desse lixo.

Nuvens compactas constroem um céu cinzento, cinzento com mil sofrimentos. Prédios sujos de fuligem lançam longas sobras que escurecem as calçadas e as pessoas que nelas caminham. A garoa resfria o ar e enlameia a enxurrada que corre pelas sarjetas. A mulher envolve-se em seu casaco. Um carro que passa encharca a sacola e espirra água em seu jeans. Ela não se move. Está cansada demais.
Suas lembranças de uma vida sem sacolas são indistintas. Quando era crianças, talvez ? Suas costas eram mais retas, seu andar mais rápido... ou isso é um sonho ? Ela não tem certeza.

Passa um segundo carro. Pára e estaciona. Dele desce um homem. Ela observa que seus pés afundam na lama. Do carro, ele retira uma sacola cheia e pesada de lixo, e a coloca em seus ombros, xingando o peso.
Nenhum deles diz uma palavra. Ela nem sabe se ele percebeu sua presença. Seu rosto parece jovem, mais jovem que suas costas encurvadas. Num momento o homem desaparece. E o olhar da mulher torna a fixar-se no chão.
Ela nunca olha para o seu lixo. Mas em outro tempos sim. Porém o que via a repugnava, por isso agora sempre deixa a sacola fechada.
Que mais pode fazer ? Dar de presente a alguém ? Todos têm a sua própria sacola de sofrimentos.

Agora aparece uma jovem mãe. Com uma das mãos ela leva uma criança, com a outra carrega seu fardo, sacolejando pesadamente. E também um velho com a face sulcada de rugas. Sua sacola de lixo é tão comprida que balança sobre suas pernas quando caminha. Ele olha para a mulher e tenta sorrir.
Qual peso estaria carregando ?, ela imagina ao vê-lo passar.
"Tristeza."
Ela se vira pra ver quem falou. Ao seu lado, no banco, um homem havia se assentado. Alto, com feições angulares e brilhantes, e os olhos bondosos. Seu jeans também está manchado de lama. Todavia, seus ombros, ao contrário, são retos. Ele veste uma camiseta e um boné de beisebol. Ela olha em volta, mas não vê se Ele também carrega uma sacola de lixo.

Ele observa o velho que se afasta e explica: "Quando era um jovem pai, ele trabalhava durante muitas horas e negligenciava a família. Seus filhos não o amam. Sua sacola está cheia, cheia de tristeza e remorso".
Ela na responde. Por isso, Ele continua.
"E a sua ?"
"A minha ?", ela pergunta.
"Vergonha", o homem diz, cheio de pena.
Ainda assim ela se cala, mas também não se afasta.
"Muitas horas nos braços errados. No ano passado. Na noite passada... vergonha."

Seu corpo se endurece, como se fosse de aço contra o escárnio que havia aprendido a esperar. Como se precisasse sentir mais vergonha. Faça-o se calar. Mas como ? Ele aguarda o seu julgamento. No entanto, isso nunca acontece. Sua voz é doce e sua pergunta é sincera: "Não quer me dar o seu lixo ?"
A mulher inclina a cabeça para trás. O que Ele está dizendo ?
"Dê seu lixo para mim. Amanhã. Lá no lixão. Não deixe de trazê-lo."
Ele limpa um pouco de chuva da face da mulher, esfrega o dedo e se levanta. "Sexta-feira. No lixão."
Ela continua sentada, muito tempo depois que Ele partiu, recordando a cena, tocando a face. Sua voz ainda persiste, seu convite paira no ar. Ela tenta esquecer suas palavras, mas não consegue. Como esse homem poderia saber tudo aquilo a seu respeito ? E, como podia saber, e continuar sendo tão gentil ? Sua lembrança se acomoda no íntimo de sua alma, como se fosse de um hóspede inesperado, porém muito bem-vindo.

O sono daquela noite lhe trouxe sonhos de verão.
Uma jovem sob um céu azul e nuvens de algodão brincava entre flores silvestres e sua saia rodopiava. Ela sonha que estava correndo com as mãos bem abertas tocando na corola dos girassóis. Ela sonha com pessoas felizes enchendo o prado de risos e esperança.
Entretanto, quando acorda, vê que o céu está escuro, as nuvens cresceram e as ruas se cobriram de sombra. Ao pé da cama, permanece sua sacola de lixo. Coloca-a sobre seu ombro, deixa o apartamento e desce as escadas em direção à rua, ainda escorregadia de neve derretida.
É sexta-feira.

Durante algum tempo ela fica parada e pensativa. Imaginando primeiro o que Ele queria dizer e, depois, se realmente tinha essa intenção. Ela suspira. Com um fio de esperança que quase ofusca seu desânimo, ela caminha em direção à periferia da cidade. Outras pessoas também estão caminhando na mesma direção. O homem ao seu lado cheira a álcool. Ele der dormido muitas noites com a mesma roupa. Uma adolescente caminha alguns passos à sua frente. A mulher da vergonha corre para alcança-la. A jovem se oferece para responder antes que qualquer pergunta tenha sido feita: "Ódio. Ódio do meu pai. Ódio de minha mãe. Estou cansada de sentir ódio. Ele disse que iria tirar esse ódio de mim." E mostra a sacola. "Vou levá-la para Ele."
A mulher acena com a cabeça e as duas caminham lado a lado.

O local está coberto de lixo — papéis, vassouras quebradas, camas velhas e carros enferrujados. Ao chegarem à colina, a fila até o topo é muita comprida. Centenas de pessoas caminham à frente das duas mulheres e todas esperam em silêncio, alarmadas com o que ouvem — um grito, um bramido cheio de dor que flutua no ar por momentos e apenas se interrompe com um gemido. Depois, o grito volta novamente. O dEle.

Ao se aproximarem, passam a entender a razão. Ele se ajoelhou perante cada um, aponta para a sacola, faz um pedido e depois uma oração. "Posso pegar a sacola ? Tomara que você nunca mais volte a carregá-la." Em seguida, o homem curva a cabeça, levanta a sacola e derruba seu conteúdo sobre si mesmo. O egoísmo do glutão, a amargura do irado, a neurose de posse do inseguro. Como se tivesse mentido, enganado ou ofendido o Criador, Ele passa a sentir o mesmo que as outras pessoas sentiam.
Quando chega a sua vez, a mulher pára um momento. Ela hesita. Os olhos do homem a convidam a ir adiante. Ele estende a mão e se apodera de seu lixo. "Você não pode viver com isso." "Você não foi feita para isso." Com a cabeça baixa, Ele derruba toda a vergonha sobre seus próprios ombros. Em seguida, olhando para o céu, com olhos inundados de lágrimas, Ele grita: "Me perdoe".
"Mas você não fez nada", ela exclama.
No entanto, Ele está soluçando como ela havia soluçado em seu travesseiro uma centena de noites. Foi então que entendeu que o pranto desse homem representa o seu próprio pranto. Sua vergonha passou a ser dEle.
Com um dedo ela toca a sua face e, no primeiro passo em uma longa noite, não tem mais nenhum lixo para carregar.
Junto aos outros ela se coloca aos pés da colina e observa enquanto o homem é enterrado sob um monte de tristezas. Durante algum tempo Ele ainda geme. Depois... nada. Somente o silêncio.

As pessoas se acomodam entre carros quebrados, papéis e fogões descartados e imaginam quem seria esse homem e o que acabou de fazer.
Como carpideiras numa vigília, elas se demoram. Algumas contam histórias, outras se calam. Todas lançam olhares furtivos ao lixão. Parece muito estranho ficar andando naquela montanha de entulhos. Contudo, parece ainda mais estranho pensar em ir embora.
Portanto, elas permanecem ali. Atravessam a noite até o amanhecer. A escuridão vem novamente. Uma corrente de amizade se estabelece entre elas, uma amizade que se formou através do homem do lixo. Algumas adormecem, outras acendem uma fogueira nos tambores de metal e falam sobre uma repentina abundância de estrelas no céu daquela noite.
Pela madrugada, todos dormem. E quase deixam escapar o momento. É a jovem que vê primeiro. A jovem que fora cheia de ódio. A princípio, não acreditava no que vê, mas quando repara melhor, logo compreende.

As palavras dela são suaves e não são dirigidas a ninguém em particular... "Ele está de pé."
Depois, ela grita bem alto para a sua amiga: "Ele está de pé".
E então, para todas as outras pessoas: "Ele está de pé!"
Ela se volta; todos se voltam. E todos vêem sua silhueta projetada sobre um sol dourado.
De pé. Sim, é verdade.


O Salvador Mora ao Lado
Max Lucado

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O TEMPO, A MORTE E A VIDA

Hoje quando acordei percebi que o mundo estava diferente de ontem, do tempo da minha infância. O passado ficou para trás. Eu não sou mais o mesmo, as pessoas também não são mais as mesmas, muitas até já se foram. Às vezes dá saudade dos tempos antigos, da fase da inocência. Mas o que preocupa mesmo são os tempos que virão. Se pudéssemos imaginar como seria o futuro descobriríamos que ele nunca chega e que quando nos damos conta ele já passou, e foi tão rápido que não deu tempo nem de vê-lo. Ainda bem! Talvez, se pudéssemos ver ao menos a silhueta dos tempos vindouros o desastre poderia ser maior, pois descobriríamos que o futuro não é como imaginamos. Nunca se sabe o que vai acontecer adiante, pois o mundo não para de girar e o relógio prossegue afoitamente em seu trabalho sem cessar, empurrando os ponteiros que atiram para todos os lados, como setas, nos atingindo com os mistérios do amanhã, enquanto achamos que aprisionamos o tempo em calendários, programando a vida, pré-estabelecendo a rotina, sem saber se o dia de amanhã virá. Será que estamos virando robôs ou não estamos bem programados?

Durante a noite sonhei com a morte, pensei na vida e descobri que ninguém está livre de se encontrar com o seu medo. Descobri que o homem não tem medo da morte, mas do que virá depois dela. O medo do desconhecido torna a vida uma grande produtora de adrenalina que nos arrebata aos pensamentos mais secretos sobre o outro lado da vida e nos torna conscientes de que a fatalidade mora ao lado da prudência e a morte nada mais é do que o embrião da vida, pois quando morremos é que nascemos, e quando nascemos da morte é que vivemos. Mas existe uma condição para que seja assim e ao menos que ela seja desrespeitada, então a morte pode se tornar um monstro intransponível que, mais do que assustar, pode possuir a vida e torná-la extinta por toda a eternidade.

Tentamos dominar o tempo e esquecemos que ele está prestes a ter um fim. Enjaulamos nosso medo da morte no recôndito de nosso ser tentando exonerar a incerteza do que virá com uma fé que muitas vezes não é suficiente para nos trazer a certeza sobre o amanhã e a vida, e esquecemos que no porão de nossa alma existe um monstro maior ainda, que somos nós mesmos. O nosso eu que quer pecar e se satisfazer dos desejos mais repugnantes que se possa desejar, se contrapondo a santidade e a justiça que ainda pode envolver o ser humano. É esse monstro que percebe o tempo acabando e se lança como um animal selvagem sobre o monturo da irracionalidade humana e se alimenta do opróbrio do ser mais importante da criação. Porque somos assim?

A vida é apenas uma experiência que serve para nos moldar a um padrão inexistente nesse mundo. Muitos tentaram com vãs filosofias, dogmas e doutrinas, teorias, misticismo e muitas outras formas, padronizar a vida que nem mesmo eles entendiam. Criaram regras, estabeleceram hierarquias, desrespeitaram o sagrado e mataram uns aos outros, fizeram terrorismo na tentativa de manipular a vida que desconheciam. Não adianta tentar entender, é preciso viver, e viver cada dia como se fosse o único, na busca de compreender a si mesmo, em seu verdadeiro conceito, na plenitude de sua intensidade. A vida está dentro de cada um e nada mais é do que a liberdade da alma de poder, em sua verdadeira essência, experimentar emoções latentes em si mesma.

O mundo quer controlar a vida, a morte quer seu fim e a vida quer somente ser vivida. Ontem eu dormi mais novo e amanheci mais velho. O espelho não me deixa enganado. A agitação da rotina me convence disso e o tempo apenas passa e me leva com ele, como um prisioneiro, acorrentado a ele com passagem só de ida, rumo ao encontro da bendita morte, o fim da gestação de um ser e o início de uma “desconhecida” vida, de um novo indivíduo. Já não penso nas coisas de menino, nem vivo como um. Minha semente já está plantada nessa terra e dará continuidade a vida, a essa vida que eu quero entender... e morrer... e finalmente viver, sem o monstro da morte me perseguindo, sem as incertezas do amanhã.

A vida que foge de nossas mãos é a mesma que nos conduz como cativos do tempo que passou, que vivemos e do tempo que virá. O tempo que queremos controlar é o mesmo que corrói nossa existência, deteriorando o vigor, corrompendo a saúde, e que nos arremessa nos braços da morte. E a morte?! Ah! A morte nada mais é do que a libertação. Deixamos de ser "homens empalhados, almas sem feitio, mentes com falhas" para enfim gozar da plenitude da existência em sua totalidade, experimentando de forma definitiva a integralidade do ser.

Contudo sem interferir no tempo individual, cada um precisa viver seu próprio tempo, pois basta à cada dia o seu próprio mal, deixando nas mãos do Criador o poder de decidir a hora do nascimento para a eternidade ou a morte definitiva de cada indivíduo, sabendo que isso é o resultado de uma escolha feita nessa vida, a de se permitir então ser controlado somente pelo dono do tempo, da morte e da vida. Mas "quando foi que ajoelhamos? Quando foi que chamamos Deus de pai? Na verdade, não somos bons filhos!"

sábado, 28 de janeiro de 2012

Um novo agitador cultural

Esta semana eu estava lendo a reportagem Onde está Oswald?, publicada na edição de julho (nº 167) da revista BRAVO!, de autoria de Barbara Heckler e João Gabriel de Lima, que questionava se existem hoje agitadores culturais tão relevantes quanto Oswald de Andrade foi em seu tempo?

É uma pergunta difícil de ser respondida, pois a intensidade com que Oswald incendiou a cena cultural do início do século passado é o que o torna um agitador inimitável, além disso o momento atual é pobre em relação à produção artística daquela época e, embora a diversidade e a multiplicidade de estilos permeiem a arte nos dias de hoje, as novas tecnologias e a internet descentralizam o fenômeno cultural contemporâneo.

Como a arte é pouco valorizada pela maioria da sociedade que tem olhos apenas para as expressões artísticas de entretenimento em massa através das mídias convencionais é difícil encontrar e destacar alguém que se identifique como agitador cultural em nossos dias. Podemos encontrar um ou outro que faça alusão a propagação das artes, estimulando escritores, artistas plásticos, atores, músicos. Porém em uma sociedade miscigenada culturalmente, embora globalizada, encontrar uma unidade ideológica entre as artes é quase impossível. Os artistas estão submersos em seus próprios trabalhos, preocupando-se com suas próprias obras mais do que em incitar movimentos, talvez até mesmo por falta de fé na extensão histórica que eles mesmos poderão alcançar mais tarde.

Mas como no fim do túnel há sempre uma luz de esperança, e como os agitadores são sempre seres apaixonantes, destaco nos dias de hoje Marcos Almeida, o jovem vocalista de uma banda de rock independente denominada {palavrantiga}, que tem se tornado um expoente de uma classe que é vista como avessa a cultura de um modo geral. Desde que a banda se formou e conquistou seguidores através das mídias virtuais e redes sociais, Marcos Almeida tem ganhado notoriedade entre os jovens por suas letras poéticas, algumas com claras referências literárias, pois além de cristãos evangélicos declarados, o {palavrantiga} é conhecida por ser uma banda de rock sem rótulo, e isso se deve ao seu vocalista que insiste através da home page da banda, ou de seu blog pessoal, e mesmo de amigos, em incentivar seu público a buscar através da cultura as respostas para as questões que permeiam a vida humana, sejam evangélicos ou não, pois em sua concepção:

“Está aí o principal motivo para qualquer produção cultural; a fome de céu, ou, o mundo inteiro que mora dentro de nós e que carece de luz, pois é só escuridão.”
(Marcos Almeida – nossabrasilidade.com.br)

Postando em seu blog textos que na grande maioria são poemas de autores consagrados,  além de comentá-los expondo seu ponto de vista sobre a arte, Marcos Almeida tem contribuído para que haja uma mudança na visão distorcida que muitos têm quando se professa a fé em Jesus e se diz evangélico e ao mesmo tempo valoriza-se a cultura e a arte, independentemente se são de cunho secular ou religioso, o que de certa forma tem agitado a cena cultural atual. E não só utilizando a web, mas por onde tem passado, seja nas apresentações da banda, em cafés literários, ou em qualquer evento cultural que tem estado presente, esse jovem de futuro promissor tem conseguido incitar a muitos a buscar resgatar principalmente a valorização e o gosto pela cultura nacional, e assim expressarmos a nossa brasilidade, sempre respaldados pela fé em Deus, o que em sua visão é o principal combustível para a expressão artística do homem como resultado do anseio pela eternidade posto por Deus em seu coração.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A ROSA E A BORBOLETA

Finalmente seu pai havia acabado mais um quadro. Estava ansioso para ver o que ele pintara. Era sempre assim, gostava de ficar no atelier vendo aqueles quadros, imaginando a história de cada um e quando o pai deixava, lambuzava alguma tela com tinta também, mas somente enquanto esperava-o terminar suas obras de arte.

Gostava de quase todos. Algumas pinturas ele não entendia, outros eram muitíssimo lindos, e sempre que o pai entrava ali, corria para ver como seria a mais nova preciosidade que nasceria daquelas mãos que com tanto carinho, muitas vezes lhe abraçava e que com o mesmo sentimento acariciava aquelas telas.

Mas naquele momento, lá estava ele, pendurado na parede, o mais novo quadro, recém saído da sensibilidade de seu jovem pai, perto da janela. A tinta ainda fresca, não impedia que a beleza contida na tela fosse admirada. Seu pai com um olhar sereno caminhou em sua direção, como que perguntando: “Gostou?”, e em silêncio deu-lhe um beijo nas bochechas saindo em seguida, deixando-o sozinho no atelier.

Como em estado de hipnose, Ele ficou, ali, parado, quieto, em silêncio, apenas contemplando a bela rosa branca, delicadamente pintada naquele quadro. Era uma rosa feita de papel de cartas. Cada pétala era uma carta e muito provavelmente, cartas de amor de algum romântico apaixonado. O que estaria escrito naquelas pétalas? Poemas, declarações de amor, carta de despedida, não sabia. Sabia apenas que era uma singela flor e que estava sozinha naquele quadro, solitária em seus segredos, silenciosa em suas pétalas, a espera somente de um lugar ideal para desabrochar na imaginação daqueles que a contemplariam.

De repente o vento de final de tarde soprou suave invadindo o ambiente pela janela, balançando a cortina, trazendo em sua companhia uma pequena borboleta, que com toda a beleza de seu vôo, vasculhou cada canto daquele pequeno cômodo, como que escolhendo um lugar para sossegar as suas asas.

Ele, o menino, apenas acompanhava com os olhos o belo voo da borboleta, tentando adivinhar onde ela iria pousar, e num estalo, imaginou como aquela rosa solitária ficaria feliz com a companhia de uma borboleta pintada ao seu lado no quadro, com quem, assim, poderia compartilhar os seus segredos de amor. Correu então para falar com seu pai e pedir-lhe que fizesse conforme imaginara.

Porém quando voltou ao atelier, quão grande surpresa ambos tiveram, pois com uma nova lufada, o vento suavemente empurrou a borboleta que, com sua fragilidade, se deixou vencer pela força do vento e pelas artimanhas do destino, acabando assim, presa na tinta fresca, ao lado da rosa e livre na ingênua imaginação do menino.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Eu sou brasileiro, com muito... com muito o quê?

Inspirado nos textos publicados por Marcos Almeida da banda {palavrantiga} em seu blog nossabrasilidade ontem (22/01/2012) e hoje, resolvi reeditar um texto meu escrito durante as últimas eleições municipais (2008).

Eu sou brasileiro, com muito... com muito o quê?

Hoje acordei pensando sobre quantas razões temos para bater no peito e cantar o hino nacional? Sobre quantos motivos temos para gritar bem alto que somos brasileiros com muito orgulho, com muito amor?


Conheço vários jovens e adolescentes, cujas atitudes, pra mim, são um exemplo de como a nossa nação não nos dá motivo pra sermos patriota. O maior desejo deles é ir para fora do Brasil, pois acreditam que tudo o que é bom mesmo vem lá de fora. O pensamento em comum é: “Pra que se empenhar por um país que não nos oferece motivos para amá-lo!”. Eles estudam mas não acreditam na educação; os bandidos se transformam em heróis, porque a polícia na verdade é do time do mal; político é tudo ladrão no submundo do Palácio Central e o Brasil é só um país subdesenvolvido de terceiro mundo.

Esse não é uma atitude isolada. A nossa juventude está sem esperança no futuro do Brasil. Os “caras pintadas” se transformaram em “caras fechadas”.

Percebi então que não precisamos sair de casa para sentirmos o fedor que exala da corrupção em que o nosso país está mergulhado, mostrando o seu estado de putrefação. O governo tenta tampar o sol com a peneira do futebol e do samba, mas deixa claro o paraíso em que o Brasil (um país de todos!) se tornou para àqueles que desejam dinheiro fácil. "A política e as leis são compradas por altas somas de dólares. Escândalo após escândalo humilham a nossa nação, amorais inescrupulosos viciados pelo poder nos governam através de um governo de puro clientelismo ordinário na rotina de destemperos da nossa nação."

Que motivos temos para nos orgulharmos desse Brasil? Sua história é toda inventada, e continua sendo manipulada. Precisamos de um novo grito de independência.

Como criticar jovens que crescem vendo seu país afundar na politicagem, onde seus maiores exemplos são os governantes corruptos; os jogadores de futebol que saem do país em busca de uma vida melhor; as mulheres sem pudor, totalmente nuas, nas revistas, televisão e calçadões da cidade; professores, médicos, advogados, policiais, políticos e toda sorte de profissionais que deveriam cuidar do povo, abusando de nossas crianças; as drogas, a violência, a discriminação racial e social. Diga-me que razões temos para cantar o hino nacional? A ordem e o progresso são só poesia. Um futuro melhor para o povo brasileiro ainda não deixou de ser utopia.

Hoje eu não tenho motivo para entoar o hino nacional, pois me sinto um filho abandonado pela amada mãe gentil. Brasileiro sim, mas de orgulho ferido por uma pátria que só tem me feito sentir vergonha.

sábado, 21 de janeiro de 2012

Sou humano, não perfeito!

"Sou humano, não perfeito!"

Essa foi a frase que li hoje cedo quando entrei no Facebook. Desde então a palavra PERFEIÇÃO não parou de ecoar na minha mente. Que palavra é essa? Existe isso mesmo? O ser humano pode alcançar o estado de perfeição na vida? O que significa ser perfeito?

O termo Perfeição deriva do latim perfectione e caracteriza um ser, ou algo, que reúne todas as qualidades e não tem nenhum defeito, nos dando a noção de completude, designando uma circunstância que não possa ser melhorada ainda mais, por já ser completa em si mesma, sendo considerada assim como uma reunião de todas as disposições sujeitas a uma unidade harmoniosa.

A perfeição é um estado inalcançável ao homem, não passa de utopia. Contudo é ético e sadio buscar atingir esse estágio, o que de toda forma o ser humano tem feito durante sua existência, através da filosofia, religião, ciência, etc.

Objetivamente, é através da arte que o homem mais tem expressado esse anseio, até mais do que por meio da fé. O conceito de perfeito esbarra na estética, um dos prícipios mais profundos da arte. E mesmo assim ser perfeito é ser como uma estátua que possui características estéticas irretocáveis, não ofende ninguém, não tem preocupações, não tem defeitos, não tem vida.

Imperfeição faz parte da finitude humana, das experiências físicas e emocionais e contribuem na formação do seu caráter enquanto vive, sem jamais encontrar a perfeição. Se prestarmos bastante atenção veremos que nada é realmente "perfeito". Sempre vai existir uma falha ou deficiência em algum ponto, num determinado momento, trazendo à tona aquela sensação de que poderia ser melhor.

O homem que sabe reconhecer os limites da sua própria inteligência está mais perto da perfeição. (Johann Goethe)

Devemos considerar também que não deixa de ser conveniente, aceitar a idéia de "perfeição". É uma questão pessoal e de momento. Alimentar o sonho sadio de que podemos alcançar a perfeição é válido, mas sem se iludir muito com isso. Reconhecer que sempre estamos tentando fazer o melhor que podemos é um passo rumo a esse estado humanamente utópico. Melhor mesmo é considerar a idéia do "humanamente possível" para as circunstâncias que podemos controlar, influenciar e transformar, deixando a idéia do "perfeito absoluto" para Deus, que revela a perfeição da “coroa da criação”, cada vez que busca regenerar a humanidade de sua imperfeição (Tg 3.2) à condição edênica do primeiro homem através de Jesus, seu Filho e Salvador do mundo.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Vamos trocar as armas por flores e livros?

Se olharmos à nossa volta perceberemos que a humanidade segue um rumo totalmente contrário ao desejo de Deus. Embora saibamos que as guerras, a fome, as doenças, a morte e tudo o mais de ruim que acontece no mundo hoje fazem parte das profecias bíblicas é pertinente dizer que não é o que o Senhor planejou para o homem.

A corrupção humana tem deteriorado o pouco que ainda lhe resta de integridade, caráter e dignidade, além de fazer a natureza gemer com dores de parto (Rm. 8.22), mostrando que o homem não consegue nem preservar o que lhe é essencial para sua sobrevivência. Verdadeiras sanguessugas é o que somos. Sugamos uns dos outros, do planeta e ainda queremos sugar de Deus.

Vivemos em um estado generalizado de pecaminosidade, seja dentro ou fora da igreja, independente de credo, ideologia política, classe social, raça, escolaridade. E observando melhor dá para entender que em tudo somos iguais, a hominalidade prevalece porque assim é que somos.

Agora pensemos juntos: vale à pena deixar que a essência humana se perca e nos tornemos como bestas feras sempre a espreita do pecado e da maldade, sabendo que podemos ser melhores e ir muito além do que somos hoje pela graça infinita de Deus e que “os olhos de Deus não se pode tapar, que o juízo de Deus não se pode comprar”?

Temos a máquina mais perfeita já criada e ainda existente na face da Terra que é o nosso cérebro capaz de unir nossa mente com a de Cristo e que nos capacita a pensar, aprender e criar.

É hora de arregaçar as mangas e fazermos a diferença seguindo na contramão do sistema. Vamos trocar as armas por flores e livros, gerando assim uma revolução cultural respaldada por Deus e embasada na criatividade do céu como resultado da expressão íntima do homem frente às questões que o relacionam consigo mesmo, com o próximo e com o Criador, revelando o eterno e o sagrado, sem perder a liberdade e a alegria de ser humano. E assim o mundo possa perceber e dizer:

“Estes que têm subvertido o mundo, chegaram também aqui.” (At. 17.6)